domingo, 19 de setembro de 2010

No limbo, Pixar e afins

Dar uma olhada de vez em quando na página da Apple dedicada a trailers é uma boa maneira de conhecer algumas novidades do cinema ainda não lançadas; qualquer orçamento ou público-alvo, só que a maioria é em inglês mesmo. Mas por outro lado, é bom ter em mente que saber com muita antecedência de filmes promissores pode ser frustrante porque as expectativas vão aumentando, até chegar o dia da estréia, em que você descobre que lugar nenhum está passando o tal filme com o áudio original; Mr Fredricksen (Up) aí ao lado ilustrando o sentimento. Isso tem acontecido cada vez mais justamente com animações desse tipo. Mais do que exigência de mercado, isso pra mim é conseqüência de uma série de pensamentos simplistas que acabaram estigmatizando o gênero como algo “menor”.

Antes de qualquer coisa: boa ou não, a dublagem para qualquer outra língua prejudica a unidade do filme. A gravação original foi concebida e aprovada por pessoas extremamente qualificadas, familiarizadas com as propostas do filme e que trabalharam para que tudo ficasse perfeito; a dublagem quebra essa harmonia e portanto não é mais a obra idealizada pelos autores, é outra coisa.

Agora alguém pode se perguntar se essa preocupação é crucial, já que em geral as animações visam um público gigantesco - crianças e adultos - e então, por quererem abraçar o mundo, faria sentido questionar até que ponto chega a profundidade desses filmes, que não podem pender pra nenhum extremo; nem bobos nem difícies em excesso. A própria dublagem tem como fim atingir o maior público possível.

Em outras palavras, um Up, um Wall-E e até mesmo um Toy Story 3 não seriam filmes que contribuem pra sua cultura de mundo do modo que um Truffaut ou um Buñuel fazem. Ora, é óbvio que não. São formas de expressão diferentes com intenções diferentes e me assombra que realmente exista gente querendo os mesmos efeitos. Mas isso também não significa que seja impossível tirar algo delas: sempre há uma abordagem que possibilita uma interpretação mais encorpada. Às vezes mais difícil do que encontrá-la é admitir que essa abordagem existe.

Mesmo se Wall-E não respirasse Kubrick, Up não falasse com tanta competência de ausência e perda e assim por diante, sempre bom curtir um entretenimento de primeira linha, com os finais reconfortantes e os mundos fabulosos simpáticos. Aliás, esse é um dos maiores diferenciais desses filmes: permitir o fantástico sem muitas justificativas, com naturalidade e inteligência. Daí a importância do áudio original, pois assim a experiência se aproxima mais do que foi idealizado.

Citei apenas a Pixar porque isso das animações circularem apenas com a dublagem em português só acontece com esses estúdios americanos enormes; com Meu malvado favorito (que é legal) da Dreamworks também aconteceu. No entanto, Ponyo (foto) do também grande Studio Ghibli de Hayo Miyazaki foi exibido em japonês aqui em São Paulo, é isso que é mais curioso. Ponyo é um filme infantil por excelência. Inocente ao extremo, bonitinho, fácil. E seu autor também foi responsável por outros como A viagem de Chihiro, Princess Mononoke e Grave of the Fireflies, complexos e consagrados. Logo, não havia dúvidas de que Ponyo, até por ser um anime, não era produto de massa e nem pras criancinhas. Mesma coisa com o stop-motion tristonho Mary & Max que abriu o festival de Sundance de 2009.

Ou seja, não são todas as animações mas um tipo específico que está nesse limbo: nem filme de autor, nem caça-níquel. Chega a ser irônico que a animação, um gênero que está sempre inovando e está sempre ligado à contemporaneidade, seja vítima de uma limitação tanto de parte do público quanto da própria indústria. Essa triste noção de que um filme de criança é para criança. Convido todos a abrirem as cabeças.

4 comentários:

  1. Correção: Hotaru no Haka não é do Miyazaki e sim do Isao Takahata que produziu alguns filmes do Miyazaki, como Laputa: Castle in the Sky e Kaze no Tani no Nausicaä.

    Sobre desenhos e crianças, a grande e esmagadora maioria dos desenhos são feitos para o público infantil, não tem como negar. Mesmo os animes, que costumam são classificados como mais maduros pelos seus fãs (como eu) são sim feitos para crianças e mesmo aqueles poucos que um público alvo adulto ainda tem um grande apelo para as crianças.
    E não só os animes, quem não gostava de ver South Park ou Simpsons quando era pequeno?

    Enfim, as pessoas tem muitos motivos pra acreditarem que desenho é coisa de criança e vai ser muito difícil mudar essa mentalidade.

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  2. 1-Bom ter o blog de volta : )
    2-Gopstei do tema em geral
    3-"Em outras palavras, um Up, um Wall-E e até mesmo um Toy Story 3 não seriam filmes que contribuem pra sua cultura de mundo do modo que um Truffaut ou um Buñuel fazem."
    Fazer uma afirmação dessa é meio complicado, depende de muitas definições e conceitos, e pode gerar algumas interpretações errôneas quanto a algo ser mais cultura que outro...
    4-Concordo que uma dublagem muda um filme, do mesmo modo que uma legenda, mas nem sempre isso é ruim, tem, alguns filmes que eu assisti dublado e legendado e prefiro a versão dublada (em animações, em outros genêros me enoja mesmo), sei la, altera de certa forma a visão do autor, mas por outro lado, tem-se uma outra obra, de forma semlehante a uma versão brasileira de uma música, que as vezes contribui com a original (outras detrói mesmo)...

    Enfim, bom texto, e continuem escrevendo!!

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  3. Gostei do tema apesar de que quando fui ver Ponyo aconteceu justamento o oposto. Só haviam sessões dubladas em todos os cinemas :(

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  4. Ponyoooooooo

    *cara de criança sorrindo* :)

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