terça-feira, 23 de março de 2010

Jazz 101: New Standards

(na foto - acima, Nirvana; abaixo, The Bad Plus: "Smells Like Teen Spirit" no século XXI)

A partir dos anos 90, músicos como Herbie Hancock e Brad Mehldau quebraram de maneira definitiva um tabu que havia atormentado o jazz por décadas. Desde o pós-bop, ao escolher as músicas que pretendia gravar, um intérprete tinha somente duas escolhas: compor algo novo especificamente para o disco ou escolher um standard, isto é, uma das canções daquela imensa coleção de músicas que o tempo consagrou como clássicos jazzísticos. Em 96, Hancock gravou o álbum The New Standard, no qual interpretava 9 faixas retiradas da música pop contemporânea, numa seleção que incluía composições de Lennon & McCartney, Kurt Cobain e Paul Simon executadas por uma banda composta por Michael Brecker, John Scofield, Dave Holland e Jack DeJohnette, todos artistas de imenso renome. A partir daí, as portas se abriram.

Seria falso afirmar que nunca antes nenhum músico tentara reaproximar o jazz do pop – em 1963, por exemplo, o guitarrista Grant Green gravou uma belíssima versão do clássico dos Beatles “I Want to Hold Your Hand” – mas esses esforços foram, em geral, só isto: tentativas isoladas. Hancock, ao contrário, inspirou uma multidão de seguidores: dois anos mais tarde, o saxofonista Joshua Redman gravou em seu álbum Timeless Tales (For Changing Times) versões de composições de Joni Mitchell, Bob Dylan, Prince e Stevie Wonder; em 2001, o polêmico grupo The Bad Plus gravou seu primeiro álbum (“O Bad Plus é um trio de jazz influenciado por pop e rock ou um power trio que gosta de tocar jazz?”, perguntou um crítico); Em 2004, o pianista Brad Mehldau registrou no disco Live in Tokyo uma versão de 19 minutos da épica suíte do rock alternativo “Paranoid Android”, do Radiohead, e em seu improviso explorou à exaustão as idéias desenvolvidas nas quatro sessões da gravação original. Essas iniciativas podem até ter gerado certo furor na crítica, mas, no final das contas, todos os músicos citados foram aceitos como artistas sérios e importantes no cenário artístico atual.

A verdade é que o jazz sempre teve certa afinidade pelas canções pop. Mesmo os standards, a que os intérpretes costumavam restringir-se, não passam, em sua maioria, de trechos da trilha sonora de filmes e musicais das décadas de 30, 40 e 50. “Summertime” faz parte da ópera “Porgy and Bess”, de Gershwin; “My Funny Valentine” foi composta pela dupla Rodgers & Hart para o musical “Babes in Arms”; “All of You”, de Cole Porter, integra a trilha do filme “Silk Stockings”; e assim por diante. No fundo, essa nova tendência não passa de uma recuperação de um hábito antigo. “Canções realmente boas te deixam com um sentimento de possibilidade e infinitude”, afirmou Brad Mehldau numa entrevista. E se isso é verdade para as canções que nossos avôs ouviam em seus gramofones, por que não pode ser verdade para as canções que nós ouvimos em nossos iPods?

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